terça-feira, 12 de maio de 2015


Fala, Galera! Hoje vamos falar sobre uma nova forma de combate à dengue, não só à dengue, mas também à malária, que em nossa visão será revolucionária e, inclusive, tem um dedinho de nossos pesquisadores brasileiros.


        As doenças transmitidas por mosquitos vetores como dengue e malária causam enorme impacto na saúde pública mundial. O controle é predominantemente voltado para a aplicação de inseticidas contra o mosquito adulto como também a utilização de mosquiteiros. No entanto, os métodos atuais de controle muitas vezes não são sustentáveis por longos períodos por causa da resistência aos produtos químicos. Neste sentido, a descoberta e aplicação de métodos alternativos são de extrema importância. Uma nova abordagem para o controle biológico de doenças transmitidas pelos mosquitos tem sido recentemente proposta que utiliza uma bactéria endossimbiótica (Wolbachia pipientis), a fim de interferir com a transmissão de patógenos.

Mosquitos com Wolbachia no insetário da Fio Cruz

        A importância de se utilizar essa bactéria é que fêmeas infectadas possuem uma vantagem reprodutiva por causa de uma incompatibilidade citoplasmática (IC), o que leva ao aumento de indivíduos infectados. Quando mosquitos Aedes aegypti foram transfectados com Wolbachia descobriu-se que a presença da bactéria inibia a replicação de patógenos, como os vírus da dengue e da febre Chikungunya. A introdução de uma cepa da bactéria Wolbachia pipientis causa redução na longevidade do mosquito. Como o período de incubação extrínseca de viroses e parasitas dentro do mosquito A. aegypti é longo (cerca de 15 dias), em comparação com a longevidade do inseto (cerca de 30 dias no campo), a infecção por Wolbachia poderá diminuir a transmissão por patógenos sem eliminar a população de mosquitos (Brownstein et al., 2003; Rasgon et al., 2003; Sinkins e O’Neill, 2000). Mosquitos contendo essa cepa apresentaram cerca de 50% da redução na sobrevivência das fêmeas em comparação com as que não a continham. Além do efeito na longevidade do inseto, uma grande surpresa foi descobrir que a presença da bactéria nos mosquitos aumenta a resistência dos mesmos aos patógenos.
        As Wolbachia são bactérias gram-negativas, obrigatoriamente intracelulares, que manipulam a reprodução do hospedeiro para garantirem a transmissão vertical (de mãe para filhos) (Sinkins et al., 1997). Nas últimas décadas a bactéria Wolbachia foi amplamente encontrada infectando diferentes espécies de invertebrados, com maior número de relatos entre os artrópodes como os insetos, estima-se que cerca de 65% das espécies de insetos estejam infectados por essas bactérias, infelizmente o A. Aegypti não é uma delas. Em uma estratégia para garantir a transmissão vertical, a bactéria manipula seu hospedeiro de diversas formas como feminização, morte de machos, partenogênese e com o mecanismo de incompatibilidade citoplasmática, assuntos que serão discutidos em postagens posteriores.



         A seguir, fotos de microscopia mostram tecidos do Aedes aegypti em situações de presença e ausência da Wolbachia. No Aedes comum, ocorre a infecção com o vírus da dengue (pontos vermelhos, na imagem à esquerda). No Aedes com Wolbachia (cor verde, na imagem à direita), o vírus não consegue se estabelecer. 
                     


Por enquanto é só, galera. Até mais, boa leitura e desculpa pelo atraso.

FONTE:

DA SILVA NETO, Mario Alberto Cardoso; WINTER, Carlos; TERMIGNONI, Carlos (Ed.). Topicos Avançados em Entomologia Molecular: Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Entomologia Molecular. Itabajara da Silva Vaz Junior, 2013.

5 comentários:

  1. Interessante também é a forma como a bactéria inibe a replicação do patógeno.
    A capacidade da cepa wMelPop-CLA para proporcionar proteção contra vírus da dengue pode também ser dependente da competição celular de componentes essenciais do hospedeiro, como foi observado em infecção com DENV-2 em células de mosquitos infectados com wMelPop-CLA. Além disso, em D. melanogaster existem evidências que cepas de Wolbachia obtêm grande parte da sua energia através do metabolismo dos aminoácidos, incluindo a treonina – um aminoácido requerido na ativação da expressão da vitelogenina (Vg) em A. Aegypti. Recentemente McMeniman et levantaram a hipótese da existência de uma competição entre a Wolbachia wMelPop e A. aegypti para a obtenção de treonina necessária para expressão da Vg e subsequente inibição no desenvolvimento dos ovos.
    Até a próxima, galera!

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  2. Grupo H
    Os mosquitos infectados pela Wolbachia não apenas impedem o estabelecimento da dengue, mas também da febre chikungunya e da malária, tornando esse um método potencialmente muito eficaz contra as epidemias que vivemos hoje. A aplicação desse método na Austrália e no Vietnã já se mostrou eficaz, no Brasil ainda precisamos de mais dados para confirmar a efetividade diante das diferentes condições encontradas em nosso país.
    Ótimo assunto!

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  3. Pense aii num tema interessante?! Esse mesmo, rs. Depois que li as postagens, corri para os comentários. Lembrei que eu já tinha falado de Wolbachia em uma outra publicação deste blog, e pra não falar nela de novo, encontrei nos comentários a inspiração pra minha mini pesquisa a fim de complementar o debate.
    Encontrei algo sobre a vitelogenina, e sobre sua expressão/função na vida do mosquito. Depois que a femea faz sua primeira refeição a base de sangue, inicia-se o processo que culminará na produção de ovos por elas, que é a vitelogênese. Para o combate ao vetor, a vitelogênese ainda é bastante utilizada como fonte de novas ferramentas como, por exemplo, a criação de organismos geneticamente modificados, levando à geração de mosquitos que se tornam inviáveis ou mesmo refratários a patógenos após a alimentação com sangue; alguns trabalhos exploram a capacidade de superexpressão do promotor de vitelogenina após a alimentação com sangue para expressar genes da resposta imune que têm a capacidade de matar o parasita (Kokoza e cols, 2000; Kokoza e cols, 2010) ou genes que podem reduzir o fitness do mosquito, alterando sua capacidade de postura de ovos e até mesmo sua capacidade reprodutiva. Isso faz parte das manipulações para o controle do mosquito, mas vale sempre ressaltar que as condições de saneamento, educação ambiental e sanitária, com mobilização popular em termos de evitar a formação de criadouro para o mosquito e de eliminar os criadouros já existentes, são medidas mais baratas e apresentam eficácia.

    Qual o próximo tema, hein?! Ansiosa aqui :)

    Abraço!

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    Mecanismos de Sinalização Celular como
    Alvo para o Bloqueio da Transmissão de
    Doenças por Mosquitos: No Caminho do
    Fosfato.
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    JABLONKA et al, 2012

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  4. Mais uma vez observamos a importância da engenharia genética utilizada como ferramenta de combate ao mosquito transmissor da dengue e da malária. É bom frisar os impactos ambientais que tal medida pode trazer a população de outros animais que dependem do mosquito, pois eles participam de cadeias alimentares e sua diminuição ou exclusão pode favorecer o aparecimento de outros problemas.

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  5. Curiosamente, a Wolbachia confere uma vantagem reprodutiva devido à chamada ‘incompatibilidade citoplasmática’: fêmeas com Wolbachia sempre geram filhotes com Wolbachia no processo de reprodução, seja ao se acasalar com machos sem a bactéria ou machos com a bactéria. E, quando as fêmeas sem Wolbachia se acasalam com machos com a Wolbachia, os óvulos fertilizados morrem.
    http://www.fiocruz.br/ioc/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=1591&sid=32

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